Quem tem medo de Kate Winslet?
Kate é a melhor atriz de sua geração – e dizer isso a esta altura é como constatar que o céu é azul. Vi ontem Revolutionary Road (que eu me recuso a traduzir por “Foi Apenas Um Sonho”), e tudo no filme me fez lembrar os melhores momentos de Liz Taylor: Quem Tem Medo De Virginia Woolf? (e sim, Di Caprio está, e é, um ator perfeitamente a altura de Richard Burton – e não um mero gado-bem-dirigido, longe do estilo careteiro que nem Martin Scorcese conseguiu arrefecer em O Aviador), ou Gata Em Teto De Zinco Quente (e também Leo nada deve, em sua beleza que fica a serviço do drama, e não o contrário, ao legendário Paul Newman).
Leo DiCaprio tem contra si o preconceito do público que se acha esclarecido (aquele que diz que não assiste filme de Hollywood, mas também não sabe que Godard não é marca de manteiga), que pensa-o como um rosto bonito e jóvem para agradar adolescentes que assistem malhação. Então tá, aviso: o rosto de Leo está adorável e naturalmente enrugado, envelhecido, cansado; o corpo curvado e já com barriguinha. Physic-du-rôle perfeito ao personagem de um ex-insubordinado que vira um pater-familis entediado.
Voltando a Kate, ela é a nossa Liz Taylor. Só que feinha, gordinha, australiana, e sem olhos violeta. Mas também sem soberba – talvez o segredo do charme de Liz: supor a ela própria que ela não era deste mundo. Kate é Liz, reduzida puramente ao talento e a técnica.
Ou mais: é como se Barbara Stainwick (a melhor atriz-coadjuvante de todos os tempos, não obstante seu melhor trabalho seja com o papel principal do genial experimento técnico A Vida Por Um Fio, do mestre esquecido Anatole Litvak) – Kate é como se Barbara Stainwick tivesse subido ao primeiro escalão! (e isso me faz lembrar que a Barbara Stainwick de nossa geração também está no filme, já meio velha: Katy Bathes).
Kate especializou-se no drama íntimo (e talvez por isso não tenha brilhado no épico Titanic – da mesma forma que Liz parece menor em Cleopatra). Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças é um drama íntimo pós-pós-moderno; O Leitor é um drama íntimo; e agora, Revolutionary Road é um drama íntimo com texto a altura de Tennesse Williams, Edward Albee – e porque não dizer, Nelson Rodrigues.
Kate Winslet não respira: atua!
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