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Poema que fiz em homenagem ao poeta bauhaus (e negro) americano e e cummings (sim, sem pontos depois da abreviação do nome: E.E., para Edward Elstin, e tudo em minúscula, sempre) – e que acabou levando o 1º lugar no último prêmio de poesia do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Pernambuco, SINTEPE. Fato estranho, como já observara, uma vez que o certame era temático em torno de um assunto sindical, a que este poema em nada responde.
Besteira compará-lo com Maiakovisky e Cabral. Ambos estão ligados a arquitetura enquanto projeto urbano maior, vastos espaços, poucos pontos de sustentação. Arcos, vãos livres, jardins. cummings não: poesia maciça, em bloco, onde nenhum espaço entre os versos e os termos pode ser criado. E não há “pontos de sustentação”: toda ela se apoia no chão. Tanto assim que sua pontuação gráfica – virgulas, travessões, pontos, exclamações – não tem nenhum valor semântico ou sintático, ao contrário do que se diz. São puro ornamento art-decor. São como os frisos laterais do Edificio Oceania (Salvador). Como as ruas convergentes de Tel Aviv (Israel). Como a ausência de brisa do Bairro da Glória (Rio de Janeiro).
A poesia de cummings, mínima, menor que a de Cabral, não dá espaço para vento, vãos livres, dentros-fora. Ela não tem nem dentro nem fora, porque só tem dentro e só tem fora. Não há jardins tampouco: é impossível brotar até mesmo um cogumelo ali.
Limpa de todo excesso, é a mais poluída das poesias. Poluída como as grandes cidades industriais do pré-guerra. É a Berlim de Weimar em forma de verso.
e <> e
um préd
io branco ro
(bótico)
busto
(abotânico
cerveja belga)
brota, como rosa morta
da mão direita (sem a esquerda)
de um negro
liquidando o espaço
o partido
a entra(da)saí(da)
(mas não de dentro da mão
mas de dentro do chão da calçada
de onde a mão garimpou sua semente
im-plantando)
põe
ma(r)
cidade des
abi(li)tada
(cotó
?
)
suas palavras em ru
í
nas
e pedaços de letras, troços-des
tra(ba)lhas (sem emprego
algum
para estes pontos
estas
ex
clamações
estas
inter
rogações
clamando
rogando
do de-dentro dos verb
etes)
– torturar os termos
como a gestapo
a uma prostituta
judia
lésbica
comunista
fazer o conceito
confessar sua inverdade
amputar as pernas das palavras
diab
éticas
tirar-lhe o gos(t)o –
ninguém respira
dentro destes versos
:
todos que neles transitam
usam máscaras contra gases
;
tóx
i
cos
(há uma guerra silen
-o-ciosa
dentro das palavrasdentrodalinguadentrodasbocasdentrodosolhos
dentro
do silêncio).
Post Scriptum: Eis que escrevendo este post, me bato acidentalmente com belíssimo prefácio de cummings (eu que já adorava esse outro prefácio dele)- que vale bem como mensagem de ano novo nesse ano doido que se inicia.
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