Homenagem de Grego
Um dos sintomas do recuo, timidez, que têm como consequência certo mediocrismo cartorial, da gestão atual da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (SECULT-BA), é esta primeira temporada de exposições sob a batuta de Albino Rubim e sem Daniel Rangel na Diretoria de Museus do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (DIMUS-IPAC; embora ele continue na SECULT em outro setor).
Chamar as exposições atuais do Museu de Arte da Bahia, Palacete das Artes Rodin, Museu de Arte Moderna e Solar Ferrão de “temporada” já é de si um equívoco: elas não dialogam entre si. Por mais que eu discordasse da política de museus da gestão de Marcio Meirelles, havia ali unicidade, coerência, qualidade, esmero e resultados. As exposições dialogavam uma com as outras e levavam o visitante a querer ver mais museus.
O que se vê hoje é no MAB a exposição de um artista judeu pouco conhecido, pseudo-modernista contemporâneo (bem ao gosto de certa arte-decorativa mais apropriada a alcovas de motéis), e que por isso nada tem a ver com as funções do MAB (ampliadas, é verdade, na gestão de Marcio para fora do século XIX, e incluido o Modernismo). No MAM, um drops da péssima Bienal Internacional de São Paulo – nada poderia ser mais colonialista quando temos a 200km de Salvador acontecendo a talvez melhor Bienal de Artes Visuais do país: a de São Félix.
Pior de todas é a suposta homenagem a 100 anos de Carybé, no Solar Ferrão. Temia que fosse uma reprise da excelente exposição de lançamento do Instituto Carybé, em 2009, no MAM. Qual nada, é peior! 14 telas inconclusas e sem legenda, e uma réplica de seu estúdio do Engenho Velho da Boa Vista de Brotas. E só. Em 15 minutos tudo já se viu e a decepção foi consumada. E, ah, no cronograma biográfico de Carybé não é sequer citada a exposição explendorosa do MAM-BA de dois anos atrás…
Pra não dizer que tudo está perdido, a exposição de Franz Krajcberg no Museu Rodin é digna, e mesmo majestosa com suas proporções monumentais, e sua teoria oncológica (e não ecológica) da natureza: vegetais que parecem se transmutar em plantas carnívoras e quinidários, corais, caravelas, águas-vivas, por efeito da poluição e da radioatividade – formas a um só tempo antediluvianas e de um futuro pós-apocalíptico.
Aliás, talvez seja esta a grande metáfora da obra do polaco baiano: o quanto de animal predatório há nas espécies de outros reinos biológicos: os fungos, cogumelos e líquens, verdadeiros carniceiros da celulose umedecida; as árvores parasitárias, como as figueiras, que podem matar sua hospedeira mesmo tendo como consequência sua própria morte posterior, tal qual uma foto mostrada na coleção lá exposta. Krajcberg, como um Proust kafkianamente deformado, reduz o homem a sua condição botânica, mas patológica em que as únicas flores são carcinomas e cancros. Até nisso o espaço foi acertado: a agonia muscular que Augustin Rodin, no prédio ao lado, impõe a pedra, ao gesso e ao bronze, Krajcberg impõe à madeira e aos vegetais.
Fora este acerto, que mais sublinha os equívocos que são as outras exposições da temporada, o que fica? Fica a impressão de eventos organizados às pressas, sem maior reflexão, e para cumprir tabela. Dispensável. Curiosamente, vieram do setor privado as únicas duas exposições-homenagem dignas: uma série de 12 croquis de Carybé acerca dos ensaios de Rudolf Nureyev em Nova York, expostos no foyer do Teatro Vila Velha durante o Viva Dança ao longo do mês de abril, e os últimos trabalhos do último sobrevivente do alto-modernismo bahiano: Mário Cravo Jr., na Galeria Paulo Darzé.