3 X Kalu / 4 X OSBA
Há quem venha reclamando que eu tenho colocado pouca agenda cultural, aqui e alhures, então hoje vai um apanhadão.
Pra começo de conversa, quem não foi ao Teatro Castro Alves na última quinta-feira 20h, perdeu um dos melhores momentos da música erudita mundial no ano de 2010: Benoît Willmann regendo a OSBA no que ela toca melhor: pré-romantismo e romantismo tardio (no caso foi Schubert, Schumann e Saint-Saëns) com Emmanuele Baldini solando no violino. Trata-se talvez do maior regente do mundo na geração pós-Abbado. Willmann não apenas conduzia uma OSBA notadamente satisfeita e empolgada com sua própria execução: ele navegava sobre ela; e ao mesmo tempo dialogava com 2 ou 3 naipes distintos com distintas indicações de dinâmica com intimidade e leveza. Mesmo que o som fosse ruim (e era, na verdade, paradisíaco), a visualidade do ato já seria em si uma obra de arte excelsa.
Baldini é habitué da Bahia, xodó do Neojibá – e um dos maiores virtuoses que o mundo já conheceu. Do naipe de um Paganini – de quem aliás tocou um improviso como bis ainda no primeiro ato, antes do intervalo (bis esse a que o Maestro voltou ao palco e sentou para assistir). Ao fim, ovação, e gritos involuntários de “Bravo!” e “Bravíssimo”.
Um concerto que custou exorbitantes R$10,00 a entrada, R$5,00 a meia. Um horror! Salvador não tem nada pra fazer, é elitista, e a Cultura Bahiana tá na UTI.
Pra quem perdeu, sem choro (não tanto, ao menos). Terça-feira próxima, dia 4 de maio, tem a série de câmara da OSBA, que não mais será na Sala do Coro, e sim na Principal do TCA. Será com Baldini e com Willmann, agora não regendo e sim solando na clarineta. De novo um ingresso insuportavelmente caro: R$10,00. Quem esse tal de Ricardo Castro pensa que é?!
Lembrando que dia 12 tem o Concerto Acadêmico, juntando Neojibá e OSBA e recebendo mais dois convidados gringos, desta vez da Venezuela. Dia 19 tem Mozart nas Igrejas no São Francisco, com direito a Sêo Ricardo em sua melhor forma: solando no piano, e de graça! E dia 27 é Alex Klein, outro discípulo de Cláudio Abbado, nas Quintas Sinfônicas da OSBA também no TCA, e com Domenico Nordio solando no violino.
Encham o peito: Salvador tem a melhor programação sinfônica do país. E quem reclamar mande voltar pra Feira de Santana e ouvir Arrocha.
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Pode não ter nada a ver samba com música erudita, mas foi ontem que conversando com Thiago Kalu (de O Clube da Malandragem) que descobri que ele tem formação em violão clássico, lê e compõe em partituras. O que explica sua incrível capacidade de execução (seu domínio de palco vem de tocar na noite desde a adolescência) e suas criações harmonicamente complexas e estudadas em pequenas pérolas como Blasfêmia.
Estive no novo espaço do Boteco Ali do Lado, que está menos mambembe e saiu da Avenida Conselheiro Pedro Luís e foi pra área-nobre do Red River, na Rua da Paciência, onde era os antigos Balcão e Bebedouro. A solução arquitetônica do lugar sempre foi boa, e lá por exemplo a Formidável Família Musical deu algumas de suas melhores performances, com o palco por sobre o bar dando ótima visão e acústica. Toda sexta-feira, a partir das 23h, Kalu faz um sambão partido-alto lá. Tem o defeito de tocar poucas coisas dele ainda (só rolou uma aquecidinha com a lindamente leniniana Cantora de Chuveiro, e no fim um “levantaê pra sambar” com todo mundo já cansado ao tocar o clássico off-radio Bom-Vivant), mas segundo o próprio vai ter cada vez mais. R$10,00 a entrada, e um programão!
Às quartas-feiras, 22h, num lugar meio mequetrefe (mas de bom gosto musical) que é o Mumbaba (em frente a Igreja de Santana, ao lado do Pós-Tudo), Kalu faz performance solo. Nada de “voz e violão de butequinho” – ao contrário, promete repertório amplamente autoral. No mesmo lugar e horário, mas no amplo espaço do segundo andar (com bem menos cara de pé-sujo) tem outro projeto dele, o Forró do Diúlson – também tentando fugir aos clássicos tradicionais e com composições de autoria própria – todo sábado até o São João.
De quebra, conheci uma outra sambista da nova geração ontem – não me recordo o nome, mas canjeou e toca sempre no Tarrafa. Digo sambista, e não cantora, porque a voz não é das melhores, mas a menina compõe e bem, e tem música em parceria com Guilherme Steve (também do Clube da Malandragem) concorrendo no festival educadora. Vou tentar achar pela rede pra ver se ponho aqui um Som das Sextas.