ih, Aninha…

01/04/2010 at 18:07

Perigo: ressentimento a vista!

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O iBahia, da rede carlista de parajornalismo TV Bahia, fez uma série de entrevistas na semana passada por ocasião do Dia Mundial do Teatro. Foram três, uma com cada um dos grandes nomes de sustento e esteio do teatro bahiano (que um dia foi de resistência): Aninha Franco, Marcio Meirelles, e Prof. Harildo Deda.

A entrevista de Aninha Franco seria cômica, se não fosse digna de pena – com ela portando-se como uma espécie de Henrique II (ou Ricardo III) de saias (saias?). Seguem abaixo trechos comentados por mim:

iBahia.com – Existe uma preocupação dos governantes em promover a cultura na Bahia?
Não. Ainda não existe uma política cultural científica. Estou lançando um livro em agosto deste ano que chama “A criação na cidade da Bahia – 1990 a 2000”. E a pesquisa com o XIII foi fundamental para escrever este livro. Eu acompanhei de dentro do XIII como as coisas funcionavam do lado de fora e eu pude perceber como as políticas são feitas. Elas ainda são profundamente artesanais e não tem cienticifismo nenhum. Não é uma coisa planejada. Mas não é só a cultura, isso acontece também com o turismo e com várias outras áreas.

Pausa dramática: o que vem a ser política cultural científica? Se ela se refere com isso a fazer políticas públicas a partir de auferimentos de dados prévios e posteriores a sua aplicação – ora, nunca antes na Bahia se fez isso. Só agora. Então, o que ela fala é mentira.

Se ela quer dizer políticas públicas alentadamente teorizadas, de modo academicista, – ora, não era essa a crítica que se fazia (ao meu ver, também falaciosa) a gestão de Márcio Meirelles? Há ou uma grave contradição, ou uma profunda desonestidade intelectual, no discurso de Aninha Franco. Ou então ela é uma eterna insatisfeita que, mesmo tendo seu Teatro XVIII reaberto com verba do Fundo Estadual de Cultura, ainda não sabe bem o que deseja – mas isso é uma questão de foro íntimo para ela tratar com seu psicanalista, e não fazendo atuações (no sentido psicopatológico do termo) públicas.

iBahia.com – Mas, do tempo que começou até hoje, você consegue perceber uma evolução?
Não. Agora na gestão de Márcio Meirelles, por exemplo, houve uma involução. Ele errou muito quando começou brigando com os artistas. As matérias primas do teatro são o artista e o público e deve-se tentar promover o encontro dos dois. A função da indústria cultural é promover esse encontro. É acertar nesse encontro. No momento em que ele (Meirelles) começa brigando com os artistas, automaticamente ele prejudica platéias desses artistas. Ele deve ter acertado em algumas coisas, mas foram muitos erros. Eu ainda não estudei o período dele, mas pretendo fazer isso.

Brigou com quais artistas, Aninha? Com alguns? Ora, qualquer mudança de rumo político implica em ruptura. Ou esta senhora acredita em parto sem dor? E mais: é involução aumentar em dez vezes o número de produções que receberam verba do Fundo de Cultura?

Novamente, ela confunde a insatisfação do teatro, com a insatisfação das artes em geral, e destas com uma suposta insatisfação do setor cultural. Com isso, ela não pode fazer a pergunta fundamental que nós aqui nesta budega temos feito: por que o teatro minguou, quando todo o resto decolou?

Lendo esta série de entrevistas uma idéia me ocorreu. O teatro bahiano, do auge de sua resistência, centrava sua produção em três autores: Aninha no XVIIItão, Márcio Meirelles no Vila Velha, Harildo Déda com as míticas montagens de formatura da UFBA e com o curso livre de teatro na mesma escola. Harildo se aposentou, e a qualidade de produção da Escola de Teatro da UFBA caiu sensivelmente desde então (embora continue uma das melhores das Américas); mais ou menos na mesma época, Márcio sai do Vila Velha e vai ser Secretário de Cultura; e Aninha passa a fazer mais brigas de rua do que peças.

Natural que haja uma crise, até por falta de líderes atuando, ou não é? Fernando Guerreiro e Possi Neto não podem ser computados nestes bastiões da resistência porque atuavam e atuam tanto ou mais fora da Bahia do que dentro – e aqui, com peças meio vaudeville, longe do realismo clássico (UFBA) ou da experimentação popular (XVIIItão e Vila do Velho). Os mais jóvens, formados por estes, como Gil Vicente Tavares, ou não tiveram tempo de consolidar sua autoralidade autônoma, ou foram morar fora do estado (caso de Lázaro Ramos, Vladimir Brichta, Wagner Moura, e outros).

iBahia.com – Mas o teatro baiano tem muitas companhias. Duas, inclusive, são conhecidas nacionalmente: a Cia Baiana de Patifaria e Bando de Teatro Olodum.
Ao meu ver, existem companhias conhecidas nacionalmente, mas nenhuma é respeitada. O Bando de Teatro Olodum foi profundamente criticado no Rio de Janeiro. Há cerca de um ano, as criticas para Ó Pai, Ó no jornal O Globo, diziam que é um teatro amador. Alguns dos grandes nomes do Bando como Tânia Toko, Aloísio Menezes e Luciana Souza saíram. E isso foi péssimo para o grupo. A Companhia Baiana de Patifaria estourou com A Bofetada na década de 90. Agora nós não temos nenhuma companhia e espetáculo sólido. Nós estamos em um momento muito complicado.

O Bando de Teatro Olodum teve sua montagem para Sonho de Uma Noite de Verão, de Shakespeare, elogiada por Bárbara Heliodora em pessoa.

Próximo ressentimento?

iBahia.com – A mídia poderia ajudar nesse momento do teatro baiano?
Não. A mídia não pode. Quando o teatro acontece, a mídia acontece junto com o teatro. Os críticos aparecem e os teatros são construídos. Quem tem que apontar e despontar é o próprio teatro e ai tudo vem atrás. Jackson costa, por exemplo, foi jogado na mídia pelo teatro. Ele começou fazendo teatro e ai passou pela televisão. O teatro promove outras linguagens como cinema e televisão E sem o bom e verdadeiro teatro a Bahia está em um momento complicadíssimo.

Comovente. No Brasil inteiro a Globo dá vez e voz ao vaudeville barato, e boicota o teatro experimental. Na Bahia, pior ainda, e o empresariado bahiano gasta os tubos com blocos de corda e abadá de axé-music e nenhum tusta com produção cultural autoral e democrática. Mas Aninha acha que a imprensa não tem em que colaborar numa Reforma Cultural não – tadinha, né, Aninha?

Para concluir: não deixa de ser hilariante que o iBahia tenha feito o lapso de grafar XIII (treze) toda vez que se referia ao Teatro XVIII (dezoito). E eu não me refiro a qualquer tipo de petismo…