Essa politicazinha de jardim-de-infância
O pouco de popularidade que resta ao prefeito de Salvador, João Henrique de Barradas Carneiro, se sustenta sobre pequenos golpes midiáticos cujo alvo preferencial é o governo estadual. Aliás, já dissemos algo semelhante aqui. Mas este ano isto ficou mais claro.
Primeiro, foi a Prefeitura Municipal propagandear que a nova iluminação do Pelourinho foi feita por ela. Não foi. A prefeitura não tem qualquer ingerência sobre o Centro Antigo de Salvador (e ainda bem!), e o projeto de mudar a iluminação do Pelô entra no bojo de ações premiadas de revitalização da área.
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Agora, é o Mercado do Peixe, no Rio Vermelho. Reforma-lo é fundamental, e claro que qualquer reforma é bem-vinda – pior do que estava, não ficará. Contudo, observe-se como foi feita. Instituiu-se uma Parceria Público Privada (PPP) entre a prefeitura e a cervejaria Schincariol – que produz a um só tempo a pior cerveja do país (Nova Schin) e algumas das melhores do mundo (Eisenbahn). Até a demolição do prédio, ninguém sabia os termos desta PPP. Agora sabemos: a Schin terá exclusividade de venda por 10 anos no local.
Ainda assim, de venda de que? Cerveja pilsen apenas? ou inclui Eisenbahn? – o que seria fundamental para elitizar a frequência do local. Inclui refrigerantes?
Dependendo dos termos da PPP, é possível que a vida financeira dos donos de box no velho Fish Market fique complicada. A Boate Boomerangue notadamente dá menos lucro do que poderia justamente pela exclusividade com a Schincariol – eu vou lá, e fico a base de água, já que nem Coca-Cola tem. E estamos falando da mais importante boate de Salvador em décadas, no seu melhor momento cultural e noturno: o bunker do pós-axezismo.
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Para-além disso, não é aí que está o pequeno golpe. Por que João Babão resolveu reformar o Fish Market do Red River agora? Ora, porque o Governo Estadual vai reformar o Mercado de São Miguel!
O projeto do governo estadual já tem verba – própria!, e não de uma cervejaria – e respeitável projeto de João Filgueiras da Gama Lima – Lelé, ninguém menos que o gênio. Projeto que inclui mudar organicamente para melhor a mobilidade vertical (finalmente, um elevador urbano! – entre o Desterro e a Baixa dos Sapateiros) e horizontal (ligando Nazaré ao Pelourinho por passarela).
A obra não começou ainda. Adivinhem porquê – porque a prefeitura não mandou a documentação de sedição do Mercado São Miguel (municipal) para o governo estadual. Sem o que o Estado não pode meter mão! Notem: apesar do projeto ser impecável, transparente, e de verbas próprias. Não paira sombra de ilegalidade – mas João Henrique boicota.
O golpe é este: quase ninguém lembra que o São Miguel existe – e por isso reformá-lo seria de fato uma revitalização do bairro da Baixa dos Sapateiros. João Henrique chama a reforma no Rio Vermelho de “revitalização” – como, se o bairro é vivissimo?! Aí João vai, pega carona do governo do estado, lança uma reforma de mercado – e boicota a mais coerente e importante, feita um nível administrativo acima.
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Agora, outro pequeno golpe tem a ver com o Carnaval. Desde ano passado se sabe que a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (SECULT – nome que aliás João Henrique deu a sua Secretaria-de-Tudo-e-Nada: Turismo, Educação e Cultural – num claro golpe midiático similar) licita trios sem corda com artistas locais e nacionais que estão despontando em sua carreira.
É certo que a SECULT (estadual, de Cultura, e não a Secretaria-De-Tudo-E-Nada, de João Mamão) demora neste certame e só divulga nomes em cima da hora. Mas, ano passado, a Prefeitura manteve na grade de blocos espaços pre-negociados com o governo estadual, usando nome genérico: “Trio da Secult 1”. E só nas vésperas, incluiu o nome do trio e do artista. Até aí, correto.
Só que este ano, nem isso! A prefeitura fingiu que não viu um chamamento público do qual participou e ganhou até mesmo Elza Soares! Da mesma forma que João Henrique e Edvaldo Brito ignoram a revolução cultural que a capital bahiana lidera no estado – e que até a Revista Bravo! já noticiou. Fico a pensar o que seria de Salvador com uma prefeitura que não atrapalhasse – não precisava ajudar, bastava não atrapalhar. Facilmente, nos tornaríamos a Barcelona do hemisfério sul.
Então, a prefeitura deixou lá a grade sem espaço pros trios do governo estadual. Isto é: sem espaço pra Elza Soares, por exemplo. Sabemos que a querela central do axé-sistem sempre foi a posição de saída dos blocos. Especialmente na Barra – na avenida, isto é organzido por antiguidade.
Ninguém duvida que esta querela será resolvida ainda esta semana. A dúvida que fica é: que pretende João Henrique com isso? Vamos supor que ele levasse esta birrinha até as vésperas do Carnaval. Bastava o Governador do Estado aparecer na TV em pronunciamento oficial e dizer: “o Governo Estadual pagou para Elza Soares tocar de graça no Carnaval de Salvador, mas João Henrique foi contra”. Pronto, o Palácio Tomé de Souza amanheceria exangue! Estamos falando de um Governador com quase 80% de aprovação popular – e de um prefeito que tem quase 40% de rejeição! E que acaba de ser vaiado ostensivamente na Lavagem do Bonfim. E que ano passado levou um ovo na cara na Parada do Dois de Julho!
Volto a carga: o que pensa conseguir o alcáide com isso? Se ele quer fazer oposição ao governo estadual, é legítimo. Pode fazer isso de forma inteligente, se apropriando de obras. Ao invés de dizer que vai reformar o Mercado do Peixe, poderia adiantar a papelada do São Miguel e se vangloriar. Ou antecipadamente dizer, ainda que mentindo, que foi ele quem trouxe Elza Soares pra tocar de graça no carnaval.
Mas não: ele prefere a pirraça. O beliscão. E Geddel, o chute na canela, típico de seu nêmesis ACM. É uma politiquinha de jardim-de-infância…
(Em tempo: este blog apoia a candidatura de Geddel Vieira Lima ao governo estadual. Geddel tem a melhor qualidade de um candidato – a mesma que tinha Paulo Maluf quando se candidatava a Presidência da República: Geddel perde. E se ganhar, fará um governo tão ingovernável quanto o de Nilo Coelho. Não desista, Ministro Geddel! Lance-se candidato!)
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