O Som das Sextas – XI
Evitei colocar foto desta vez pra evitar rejeição, afinal eu também detesto Vander Lee. Mineiro demais, ultra-romântico de um modo meloso (como diz Pedro Pondé, romântico na Bahia é libertário como Castro Alves – eu completaria: em Minas, é só choramingueiro), para mim que sou bahiano e anti-romântico.
Uma vez o defini, a partir da célebre máxima apócrifa de Otto Lara Resende (segundo Nelson Rodrigues), como “a solidariedade cancerígena em forma de canção”.
Contudo, como soe de ser na tradição mineira, quando ele resolve fazer samba, faz muito bem. Digo tradição mineira porque o chatíssimo João Bosco é dos maiores sambistas do país, quando faz sambões como Incompatibilidade de Gênios, Prét-a-porter de Tafetá, Princesa do Daomé, Toma Lá Dá Cá, entre outros mais conhecidos. Clara Nunes, uma das maiores interpretes do Brasil no sambão-enredo (talvez a única mulher neste gênero), era mineira; e Ataulfo Alves também.
Talvez porque Minas é o meio do caminho entre o lugar que criou o samba, a Bahia, e o lugar que o aprimorou, o Rio de Janeiro.
Contudo, o principal é: ninguém pode questionar o fato de que Vander Lee faz canções. Melosas, bregas, ana-carolinicamente óbvias, ruins – mas canções! É, neste sentido, digno de mérito: está entre os que retomou este formato (no caso dele, nas mais variadas direções: da balada ao rockinho, da moda de viola ao sambinha). Sinal dos tempos – e do equivoco de Chico Buarque em dizer que a canção morreu.
Por isso, vale lembrar hoje, no Dia da Consciência Negra, que Minas é um estado quase tão negro quanto a Bahia e o Rio; e que lá, a escravatura pesou talvez mais, só que de modo silencioso, escondido nas montanhas imprescrutáveis onde o oculto do mistério se escondeu.
Dois ótimos sambinhas, portanto, do não obstante detestável Vander Lee.