Falta ritmo
O Festival de Música Instrumental da Bahia acabou por se tornar um belo exemplo de anacronismo. Ele segue exatamente o mesmo padrão tímido e algo colonialista dos festivais da longa Era Paulo Gaudenzi – período em que nasceu.
Claro que não se diz, com isso, que seus idealizadores são carlistas em aspecto algum. Muito ao contrário: o Festival, por não ser montado pelo Estado (diferentemente do Atlier do Coreógrafo Brasileiro, sempre péssimo), foi um foco de resistência, e trampolim para alguns dos atuais baluartes do pós-axezismo: Orkestra Rumpilezz e Retrofoguetes (ambos juntos o ápice que é Maldito Mambo, do disco ChaChaCha – que não aconteceria se Morotó Slim não tivesse conhecido Letieres Leite nos corredores do XV Festival de Música Instrumental).
O que há é que, como o pessoal do Cultura na U.T.I., eles não pegaram o novo ritmo, mais arrojado e dinâmico, atual. Claro, o Festival de Instrumental não fica na ranhetice do UTI, até por ser capitaneado pelo excelente Fernando Marinho.
Senão vejamos: o Festival ocupa noites longuíssimas apenas na sala principal do Teatro Castro Alves. São noites cansativas, com 3 ou 4 apresentações díspares. O encerramento, com a Spok Frevo Orquestra, acabou mais de meia-noite de domingo para segunda-feira!
É tão exaustivo que se chega ao fim da noite sem vontade. Mais: sem ter trocado nada com ninguém. A plateia recebe, e ponto final. Baixíssima interação, numa lógica (para usar um termo de Paulo Freire) totalmente bancária.
Quando me refiro a timidez, é que um tal festival deveria já ter alçado dimensões mundiais. Marcio Meirelles fez isso com o FIAC e o FILTE, e mesmo o Carnaval ganhou uma dimensão mais ampla.
Digo: o Festival de Música Instrumental poderia ser, hoje, uma Bienal Internacional de Música Instrumental na (e não da) Bahia. Poderia durar 2, e não 4 dias. Mas dois dias mais maleáveis: ocupando, da manhã à madrugada, o espaço de todo o complexo do TCA: Concha Acústica, foyer, sala principal e sala do coro, salas de ensaio, jardim suspenso. Ao invés de ingresso, pulseira. Dois ou três shows simultâneos – um em cada palco. Bancas com venda de material, inclusive de artistas não-selecionados pelo Festival. Oficinas, debates, banca de negócios.
Não é novidade: o Mercado Cultural Mundial dos bons tempos era assim. Acontece que, na época, o Mercado Cultura era exceção. Hoje, é regra – e exceção é o modelo conservador do Festival de Música Instrumental (FMI).
Os organizadores podem dizer que mal teve verba pra 3 dias num palco só, que dirá algo maior e mais arrojado. Replico desde já que projetos arrojados naturalmente captam mais verba, de origens mais variadas – e sendo num formato Bienal Internacional, poder-se-ia conseguir patrocínio robusto inclusive estrangeiro. Como o Mercado Cultural conseguia da Fundação Ford.
Não tem pra onde correr: falta arrojo. O FMI precisa ficar up-to-date com o modus faciendi atual. É melhor do que apenas reclamar.