A parte pelo todo
Em boa medida, o problema do Movimento Cultura na UTI é uma questão de sinedoque: de substituir a parte pelo todo.
Queixam-se eles de que a produção teatral bahiana enfraqueceu na Era Marcio. Enfraqueceu mesmo, e eu acrescento: o cinema no estado já foi mais forte, com uma Sala Walter lotada, um Sala de Arte mais forte enquanto grupo, e ambas juntas forçando o Multiplex a reexibir clássicos mesmo fora de festivais.
Esta queda tem um sentido. Tivemos no teatro e no cinema a grande resistência contra o axezismo. Uma vez que este se arrefece, é normal que precisemos menos de bunkers de resistência. Sobre isso, observe-se como o pós-axezismo é basicamente musical: uma miríade de talentos vindos do anti-axé, do samba do Clube da Malandragem e das Moças, a música erudita da OSBA e do Neojibá; da retomada do Jam no MAM, ao jazz nagô da Orkestra Rumpilezz; o rock elaborado melodicamente do Retrofoguetes, o engajamento poético-político nada óbvio de O Círculo, a leveza altamente criativa da Formidável Família Musical.
Isto é: ao arrefecer o axé-sistem, a Era Marcio acabou arrefecendo também seus mais valorosos opositores dos mais duros anos.
Isso não torna tal efeito justificável – apenas compreensível. Nem minimiza a irresponsabilidade de Aninha Franco ao fechar o Theatro XVIII, nem a incoenrência de Claudio Marques em abrir o Unibanco Artplex Glauber Rocha.
Fato é que, tendo em mente isto, e passado dois anos de relocação de forças, cabe ao Estado voltar-se novamente para os que bravamente nos protegeram da mediocridade nos duros anos 90/2000. Além do que, estes entes poderiam ocupar, agora, um lugar totalmente novo, e proativo, na atual dinâmica cultural da Bahia.
É justamente ao dizer que a Cultura (que vai bem) vai mal, e não o Teatro e o Cinema, que o Cultura na UTI se perde totalmente, e se torna inoperante. Falta foco, precisão, rigor; e sobra negação do restante da realidade.