Um poema para o Maranhão
Alguns Amos de Boi
para o maranhãense Catulo da Paixão Cearense
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Eu vi mestre Chagas, na Maioba
sustentar sua voz ocilante
como ronco de tambor, não-onça,
como de pandeirão, toque insistente;
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voz que por si se sustenta,
afiada, mas não como faca,
antes como matraca, em que
cada repique dura eternamente.
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Vi Humberto guarnecer seu batalhão,
no Maracanã, pesado, de voz incisiva;
como agulha, que fura o couro duro
furava ela a massa dos pandeiros,
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e no entanto, voz que incendeia
tambores e matracas
como se fora faísca
numa palhoça à luz do dia;
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Vi Chiador, joão de nome próprio
posto e bem posto, aboiar
não como aboio, nem como
sopro de corno, berrante,
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antes cantar chiado, como seu nome
do alto do Ribamar, nome de pássaro,
chiar qual maracá, que ele balança
no corropio dos caboclos de penacho.
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E vi, da Baixada, Cazumbás do Pindaré,
suas vozes anônimas, raquíticas,
voz de quem tem frio, não o frio do frio,
mas o frio do calor, da chuva úmida,
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voz pequena, que pinta
a natureza bruta, elementar
voz que deixa o cantador se sustentar
como pintor pendurado no pincél.
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vozes muitas, vozes coletivas
mesmo quando um só aboia
voz guarnecida de mais vozes, inauditas
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de zabumbas em cânone, sincopadas
desencontradas, como samba em movimento,
samba-mínimo, grano-duro, samba lento,
vozes que sambem mais do que cantar tentem.
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E vi do Axixá, do Munim a Imperatriz,
voz empostada, bem falada, pausada, recitada,
voz de político em constituinte,
honesta, ainda que desconfiada
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voz aberta, macia, sala cheia
da ausência de uma festa que se foi,
macia não como sobre-cama,
antes como dentro da almofada
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de plumas, coloridas, ela é chapada
de uma só cor, nesta orquestra de cores
brilhantes coloridas, onde tudo reluzeia
e até as notas musicais são cor de Ilha.
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